Decisões e Inclusão – Exercício Antecipatório 1
Num exercício reactivo e imbuído dos ruídos, tímidos diga-se em abono da verdade, poderia hoje falar-vos de Intervenção Precoce.
Um início poderia ser o relato de experiências advindas das crianças que conheci em contexto domiciliário ou mesmo hospitalar. Dos muitos acompanhamentos a equipas de Intervenção Precoce no âmbito de funções de supervisão.
Não o farei porque não é esse o meu objetivo e a leitores menos atentos poderia ser percepcionado como discurso narcisista.
Outro início poderia ser a socialização e contemporização de memórias relativas à formação na área da Intervenção Precoce que aconteceu há alguns anos por todo o país sob, e não só, com a chancela do Ministério da Educação. Escrever-vos, como exemplo de entre outros, daquele Alentejo, que soube disseminar essas práticas e, mais tarde, ganhar prémios bem merecidos.
Não o farei porque poucos conseguirão situar o que acontece hoje nos pressupostos que então muitos, como eu, defendiam.
Não o farei porque não é esse o meu objetivo e a leitores menos atentos poderia ser percepcionado como discurso de auto elogio.
Outro início poderia ser a partilha de textos de opinião e académicos que há alguns anos mas não os suficientes para estarem desatualizados, diga-se em abono da verdade, escrevi sobre a Intervenção Precoce.
Não o farei porque não é esse o meu objetivo e a leitores menos atentos poderia ser percepcionado como ato de presunção.
Outro início poderia ser falar-vos de práticas e conceitos concretos, das suas dimensões teóricas das seus impactos práticos tanto ao nível social, como pedagógico e mesmo económico.
Não o farei porque não é esse o meu objectivo e porque seria impelido a contar-vos as histórias de como o Programa Portage é utilizado enquanto instrumento de avaliação sumativa.
Não o farei porque não é esse o meu objetivo e porque seria impelido a contar-vos sobre os critérios de elegibilidade, repito, sobre os critérios de elegibilidade de crianças para as equipas de Intervenção precoce.
Não o farei porque não é esse o meu objectivo e porque seria impelido a contar-vos sobre a realidade prática de como são vividas no dia-a-dia as dinâmicas do trabalho em equipa, na maioria das equipas de Intervenção Precoce.
Não o farei porque esse não é o meu objectivo e porque teria de vos contar as histórias das “estranhas relações” entre a Classificação Internacional de Funcionalidade (CIF) e as práticas, entretanto tornadas teoria, da Intervenção Precoce.
Não o farei porque não é esse o meu objectivo e porque teria de vos contar como coexistem, tantas vezes, dois documentos de planificação aquele que pertence aos profissionais da dita equipa de intervenção precoce e aquele que pertence aos profissionais da dita educação especial. Os argumentos são vários e a prática "contra natura" teórica e prática pede/tende a ser complementada por uma legitimação "técnico/politica" sempre atenta ao verso e reverso.
Não o farei porque não é esse o meu objectivo e porque teria de vos contar da manutenção, tantas vezes, de dois processos individuais. O das terapias ciosamente guardado numa qualquer instituição especial e com recursos especialmente técnicos e o da educação guardado ciosamente numa sede da equipa e/ou numa sala de jardim de infância e/ou num domicilio. Tudo isto em nome do trabalho em equipa que tantas vezes se arroga como transdisciplinar e interserviços. Nomes multidisciplinarmente vãos e esvaziados de sentido prático e quantas vezes teórico mas sempre disponíveis para um qualquer acto normativo que antecipe o tal futuro que nunca devia ter sido passado.
Não o farei porque não é esse o meu objectivo e seria tentado a falar-vos das histórias que se contam sobre a gestão dos recursos, em algumas equipas de Intervenção Precoce, afinal serão só histórias.
Não o farei porque não é meu objectivo e porque poderia contar-vos de como um dia escrevi num documento: Intervenção centrada na família e na criança. De como o documento foi devolvido com a nota da “chefe”, sempre de serviço, que dizia algo como: não percebo como a intervenção pode ser centrada na família e ao mesmo tempo centrada na criança. Afinal quem está no centro da Intervenção? Esta nota foi posterior e oralmente reforçada por argumentações centradas nas ideias atribuídas ao reconhecido especialista (que não nomeio por respeito ao seu saber e à sua memória) e que ontem como hoje servem à mesma “chefe” como a outras “chefes” para justificar muitas ideias e também, muitas vezes, os seus contrários. Mudei a expressão: Intervenção centrada na família e focada na criança.
Não o farei porque não é esse o meu objectivo e a leitores menos atentos poderia ser percecionado como ato de cinismo e estranhamente antecipatório.
Outro início poderia ser criticar as tais orientações que, pressupostamente, obrigariam/obrigam os senhores directores a decidir que as funções na Intervenção Precoce seriam/sejam, automática e prioritariamente, atribuídas aos professores com “horário zero” e/ou problemas de saúde.
Não o farei porque honestamente me obrigaria a falar do silêncio que tem havido relativamente à forma como têm vindo a ser colocados os docentes nas equipas de Intervenção Precoce.
Não o farei porque honestamente me obrigaria a falar da forma como as funções dos docentes colocados nas equipas de Intervenção Precoce têm vindo a ser (re)construídas por relação à (re)construção das funções de outros profissionais.
Não o farei porque honestamente me obrigaria a falar do papel que têm tido, não só na actualidade, as diversas estruturas nacionais e regionais de acompanhamento ao sistema de Intervenção Precoce.
Não o farei porque honestamente me obrigaria a falar da dimensão, contida nessas orientações, de legitimação legal e à escala nacional de práticas que, embora conjunturais e localizadas, existem.
Não o farei porque não é esse o meu objectivo e a leitores menos atentos poderia ser percepcionado como ato de oportunismo.
Então interrogar-se-ão os leitores verdadeiramente atentos qual o meu objectivo ao partilhar este texto nesta rede virtual que é a internet e a que só os atentos acedem. Pois digo-vos que só tenho, hoje, um objectivo... ler atentamente e conjuntamente convosco dois pequenos textos. É só “clicarem” em cada um dos conjuntos de palavras antecipatórias e noutra realidade virtual acompanharem-me na leitura.
Texto 1.
Texto 2.
Era meu objectivo que o términus destas palavras fosse a expressão tão beirã: Bem hajam.
Não a utilizarei porque me assacou a memória da primeira vez que a coloquei no final de um documento institucional a nível nacional e a “chefe”, sempre de serviço, me chamou para perguntar o que queria dizer com “bem hajam”. Após a minha explicação com o argumento simples e tão só beirão, mandou-me retirar a tal expressão informando-me que parecia um padre a falar.
Sempre obrigado aos que, em maior ou menor silêncio, ledes as minhas palavras.
3/06/2017